sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Making of - Max Payne


Traduzido pelo colaborador Henrique

De 2001 a 2003, não foi apenas a câmera em terceira pessoa que fez o mundo voltar seus olhos para Max Payne. Nem tão pouco por seus gráficos excelentes ou pelos jogos de PCs terem dado um salto para o lado dos consoles, de onde nunca mais voltariam totalmente. Mais do que tudo, foi devido a um homem. Um suspense feito por apenas duas dezenas de pessoas em Espoo, Finlândia - uma "banda de garagem", de acordo com o escritor Sam Lake. Era a história de um homem implodindo. A porta se abriu naquela cena devastadora, a esposa e filho recém-nascido mortos por viciados em drogas e em um minuto os gamers tinham adquirido uma nova sede de vingança.

"Para mim, o ponto de partida foi este estereótipo de um detetive particular, um policial durão”, diz Lake, cuja foto nem precisaria ser posta aqui, assim como a de Max, por razões que você já conhece ou vai saber logo mais. “A equipe queria cenas e idéias como as vistas em muitos filmes de ação e crime da cultura pop em geral. Queriam algo que não tinha sido visto muito nos jogos."

"John Woo tinha esse estilo visual de um monte de lixo voando no ar e nós gostamos deste estilo", diz o líder de programação Olli Tervo. "Muitas coisas tinham que estar acontecendo ao mesmo tempo."

"Uma das primeiras coisas que fizemos tecnologicamente foi o sistema de partículas", acrescenta Sami Vanhatalo, artista técnico do jogo. "E uma vez que você começava a ver os efeitos de partículas junto com este slow-down era um sentimento como: “Cara, alguma coisa boa deve sair daqui".


Lake, no entanto, estava mais preocupado com outra coisa. Ele queria algo "mais profundo, mais psicológico", do que existia em jogos de ação da época, algo preocupado com a turbulência tanto exterior como interior, a cidade, assim como as pessoas que vivem nela. Grande parte do que define Max Payne até hoje é o estranho ar escandinavo que rasga as ruas de Nova York, batendo em suas janelas como uma nevasca impenetrável que devora o horizonte. Ragnarok, a visão nórdica do fim do mundo, era como uma associação natural, sugere Lake, assim como qualquer barraco sujo ou beco da paisagem remete à Nova York.

"A jornada de Max é uma história de vingança de um homem que foi empurrado a uma situação tão impossivelmente insana que a vida cotidiana normal perdeu o seu significado. Ela desapareceu. Então você não pode descrever o que estava acontecendo naquele contexto - ou, pelo menos, Max não conseguiu. Tudo o que resta são estereótipos e metáforas, monstros e demônios. Tudo torna-se um mito. Parecia que a coisa certa a fazer era trazer todas essas referências ao jogo." Além disso, como lembra Lake, um certo grau de comédia. Não que isto seja algo que você possa encontrar automaticamente em seringas descartadas, bebês mortos e tacos de beisebol. "Nós não queríamos evitar essa sensação de extravagância, porque o jogador está sempre criando situações cômicas, em qualquer caso, sempre. O humor é uma parte natural do gameplay e, como escritor, você está sempre tentando combinar a experiência de jogo com isso. Se você é muito sério, simplesmente não dá certo."

O desenvolvimento de Max Payne durou vários anos, com os anos de 96 e 97 vendo o salto de Quake II da era de placas aceleradoras 3D para, como a Remedy iria descobrir, um realismo quase fotográfico. Até que a tecnologia interveio, o jogo foi um esboço cartunesco desenhado inteiramente à mão. "Mas se quiséssemos ambientar o jogo digamos, em algum motel desprezível de Nova York, precisávamos de algum tipo de referência", diz Vanhatalo. "Nós já enviamos os caras da arte para alguns bairros realmente desagradáveis com um par de guarda-costas, e então nós percebemos que tínhamos todas as fotos. Por que não usá-las como base para nossas texturas? Havia um monte de truques de arte que você poderia usar para conseguir usar essas texturas no trabalho: tirar todas as informações de luz desnecessárias, por exemplo. E uma vez que tínhamos decorado parte do jogo, todo mundo estava tipo: 'Uau. Isso é o que eu estava tentando fazer." Bem, não exatamente todos. Para alguns, explica o co-fundador e diretor de desenvolvimento Markus Maki, a chegada das texturas do mundo real pareciam menos como o começo de algo e mais com o final. "Para eles, você não era um artista se fizesse algo parecido. Mas se você está baseando as coisas no mundo real, é apenas a coisa mais sensata a se fazer. "Houve receio de que ele não iria funcionar? "Eu não acho que essa era uma opção."


Lake já havia lançado a ideia de usar painéis gráficos para as cutscenes do jogo, baseando-se em vários exemplos fortemente photoshopados. As vantagens, diz Maki, já falam por si: "Com uma graphic novel, as nuances existem na cabeça do leitor e seria muito mais difícil chegar a esse nível com sequências in-game ou cinemáticas, mesmo que pré renderizadas. Hoje se pode fazer essas coisas mais realistas; naquela época as coisas eram totalmente diferentes. E havia outro motivo: o custo de produção.

"Nós fizemos um monte de modificações e reorganizações na história mesmo assim. Uma vez que você tinha as graphic novels, você podia cortá-las, colocá-las nas paredes, acompanhar todo o jogo e dizer: 'Ok, isso deve na verdade estar aqui’. E em 30 segundos você faz uma mudança dramática no enredo. Mesmo que isso significasse refazer algumas das imagens, você estava falando de um dia ou dois, em vez de uma semana inteira refazendo uma CG".

Fãs e críticos sabem muito bem é claro, do efeito colateral da proposta de Lake: um toque de quebra da quarta parede digno de Stephen King, que mostra o escritor despertando uma manhã e descobrindo que ele havia se tornado seu personagem. "Nós ainda estávamos falando sobre esse aumento do fotorrealismo nos games e naquele momento não parecia ser um grande problema", admite ele quando fala de ter seu próprio rosto enrolado em pedaço poligonal da cabeça de Max. "Com todos estes quadros feitos à mão, ninguém iria me reconhecer de qualquer maneira. Mesmo anos a frente, no término do projeto, quando estávamos usando as fotografias para todas as texturas do jogo, lá estava eu.Neste momento, eu ainda poderia mudar as coisas."


Sam Lake
Ele insistiu que seria divertido e com o seu papel em expansão, incluiu a colocação de muitos de seus amigos e parentes como rostos de policiais, executivos, políticos e bandidos. "E se você olhar para nós, não parecíamos exatamente mafiosos italianos", admite Vanhatalo. "Então nós ficamos tipo: 'Depressa! Dê uma olhada naquele cara entregando as pizzas. Traga ele aqui por aqui por um tempo, vamos tirar umas fotos!”. Nos créditos do jogo há uma infinidade de primos, pais e namoradas, inclusive figuras da indústria dos games neles. Um inclusive é agora do alto escalão da AMD.

Lake é reconhecido na rua? "Em feiras como a E3 a maioria das vezes, onde eu estava fazendo inúmeras demonstrações de Max Payne e Alan Wake. Houve uma situação uma vez alguns anos atrás, quando eu estava voltando para casa a do escritório em Espoo. Ele fica em um bairro agradável, mas a rua estava totalmente deserta, além de mim e um carro. O carro freia e vejo quatro caras espiando da janela. Em seguida, ele se vira, me passa novamente e para em frente a mim. Dois caras saem e gritam para eu parar, e a esta altura eu estava me borrando. Em seguida, eles passam a me perguntam se eu era o Max Payne, e eles queriam meu autógrafo. Isso acontece raramente, felizmente. Finlandeses são pessoas reservadas. Nós raramente falamos com estranhos."

Timothy Gibbs, a face de
Max  no segundo jogo
"A coisa toda acabou gerando um monte de trabalho, no entanto. Essa foi uma das razões pela qual eu não queria fazer uma sequência, porque a agenda estava muito apertada e não havia muito mais história. O roteiro do primeiro jogo era algo como 150-160 páginas - para a sequencia acabou sendo 600. Não fazia qualquer sentido desperdiçar um mês ou mais de tempo de escrita preciosos para aquelas sessões de fotos novamente. Na primeira vez, nós não tivemos escolha."

A sequencia, Max Payne 2, com melhor física e atuações, era uma proposta completamente diferente de seu criador. A compra da The Gathering pela Take-Two resolveu qualquer tipo de problema de relacionamento anterior com a Rockstar Games, cujo interesse era nada mais do que agregar valor ao produto.

"Eles eram uma empresa muito excêntrica que trabalha de maneira estranha", diz Vanhatalo. "Mas, surpreendentemente compatível conosco. Não me lembro de um único caso em que alguém estava tentando orientar-nos para fazer isso quando realmente queria fazer aquilo. Nós estávamos no mesmo barco o tempo todo. "Eu me lembro de algumas propostas de um dos produtores da Rockstar, que queriam mexicanos, coisas assim. Mas aquilo realmente não era legal", acrescenta Mäki. "Ambos queríamos melhorar o valor de produção e ser mais ambiciosos com a história. Eles são caras simples e honestos: eles almejam muito, mas ajudam muito quando você precisa deles. Depois de cinco anos de trabalho com eles, eu não acho que ninguém tem nada de ruim a dizer."

Enquanto a Remedy definia a introdução de suas partículas no início da engine física Havok, Lake foi deixado para lutar com um dilema mais óbvio: e agora? O que vem por aí para o policial que havia destruído o mundo de seus inimigos - como eles destruíram o seu – ficando apenas em cima dos escombros? Em The Fall Of Max Payne aprendemos a resposta: se a vida não poderia ficar pior para Max, ela certamente poderia ficar mais complicada. Será que a introdução de Mona Sax, a femme fatale em uma sequência maior, mais sombria e mais aberta poderia causar problemas para uma história que foi em sua síntese sobre o isolamento e a desintegração de um só homem?


"Eu fiquei preocupado e eu trabalhei bastante," Lake admite. "A principal razão foi a narração de Max, seu monólogo interno. Ela foi uma ferramenta muito importante para contar a história, talvez a mais importante. Através dela, podemos saber o que Max pensa e sente. Ele não é um vaso vazio. Eu queria mudar a Mona [ela mais tarde se tornou um personagem jogável] - na verdade, se tivesse havido mais tempo, teria sido legal adicionar fases onde você joga como Vinnie, Vlad e Bravura - mas foi difícil. No final, Max lista essas sequências com sua narração, dizendo que ele não sabe exatamente o que aconteceu, ou o que Mona fez, mas deve ter sido algo como aquilo. Em outras palavras, quando você está jogando com Mona, você está realmente experimentando o palpite de Max nos eventos".

O jogo foi muito bem aceito pela critica e pelos fãs e portado para PS2 e Xbox, o que ajudou a série a alcançar um faturamento de mais de sete milhões de cópias vendidas na época.

"Acreditamos fielmente em se concentrar em alguma coisa", insiste Maki. "Eu não tenho certeza de que poderia fazê-lo tão focado hoje em dia, já que as expectativas das pessoas tem crescido e ela tem sido atendida. Proporcionar uma experiência e entregá-la bem. Nós sempre fomos muito agressivos ao cortar coisas de um jogo", diz Vanhatalo. "Nós nunca fomos fãs de ter que recuar até o início da fase para pegar a chave vermelha, por exemplo. Todos aquela coisa dos 30 segundos [uma referência à reciclagem dos momentos de ação de Halo] é muitas vezes chamado de loop de ação - e esse era o nosso loop. Um bom exemplo recente seria algo como Call Of Duty 4: você praticamente fazer a mesma coisa, mas com uma arma diferente e em um lugar diferente, fazendo o loop tão perfeitamente que você não se cansa dele. "

E é claro, não pode-se deixar de se falar da outra face de Max Payne - a de Mark Wahlberg, estrela da adaptação para o cinema da Fox, que, do lado de fora, mantém-se fiel à temática do jogo, personagens, cenários e arte, mas só por fora. A equipe da Remedy - que descobriu sobre o filme através da Internet, tendo vendido os direitos em 2001 – continua com a esperança de que um dia seja feita uma boa adaptação de sua obra. "É natural que não fossemos envolvidos", disse Lake. "Somos uma pequena desenvolvedora - queremos nos concentrar no que sabemos fazer melhor. É bom, no entanto essa sensação de que algo que você criou foi interessante o suficiente para que as pessoas façam a sua interpretação. Jogos e filmes são muito diferentes, algumas coisas funcionam e outras não. Estamos ansiosos para ver mais. "


"A vantagem para nós foi que muitas dessas coisas são raramente vistas em jogos, mas muitas vezes vistas em filmes, então foi divertido explorar esse material", diz Lake. "Nós temos esse ditado no escritório:" alguns chamam de clichês, nós os chamamos de clássicos '. Fazer um filme é uma coisa totalmente diferente, porque você já viu essas coisas muitas vezes. "Vamos esperar então, que os produtores de Max Payne estejam desfrutando de uma reversão desse processo, usando fantasia do videogame para quebrar o molde de como fazer um filme policial. "Eu gostaria de pensar que sim, definitivamente", sorri Lake.

Ma por pior que possa ser uma continuação cinematográfica, pelo menos nos games Max Payne está em boas mãos. A equipe de Remedy, que está trabalhando arduamente em seu thriller Quantum Break, apenas trabalhou como consultora de alguns aspectos da continuação e confia plenamente nas habilidades de contar histórias da atual dona de Max Payne. "Max tem uma boa reputação na Rockstar e eu tinha certeza que eles iriam fazer algo impressionante com ele. Nós trabalhamos com Max por sete anos e, para ser honesto, foi mais do que suficiente. Ele é um cara sombrio demais para você gastar o seu tempo. Agora, porém, há momentos em que você começa a pensar sobre o tipo de histórias que você poderia fazer com ele." disse Lake.

Texto original: Edge

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